Sistema nacional de qualificações
O Sistema Nacional de Qualificações (SNQ) inclui, por definição, todos os aspetos da atividade de um país relacionados com o reconhecimento da aprendizagem e outros mecanismos que conjugam a educação e a formação com o mercado de trabalho e a sociedade civil. Inclui a elaboração e aplicação de dispositivos e processos institucionais relativos à garantia da qualidade, avaliação e atribuição de qualificações. Pode ser composto por diversos subsistemas e contempla um Quadro Nacional de Qualificações (QNQ).
Em Portugal, a criação do Sistema Nacional de Qualificações (SNQ) foi aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 173/2007, de 7 de novembro. Entre os seus objetivos, destacam-se:
- a promoção da generalização do nível secundário como qualificação mínima da população e
- a aposta na qualificação de dupla certificação, quer através do aumento e generalização da oferta de cursos de educação e formação profissional, quer através do reconhecimento, validação e certificação de competências de aprendizagens formais, informais e não formais.
No caso dos adultos, o SNQ veio dar continuidade a um sistema de recuperação dos níveis de qualificação da população adulta, mobilizando para o efeito instrumentos como o reconhecimento das competências adquiridas ao longo da vida em contextos formais, informais e não formais e as ofertas de formação profissionalizante, promovendo a sua frequência junto da população ativa.
No âmbito das políticas nacionais em matéria de educação e formação, o SNQ (Decreto-Lei n.º 396/2007, de 31 de Dezembro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 14/2017, de 26 de janeiro) integra um conjunto de estruturas e instrumentos que permitem assegurar a relevância da formação e das aprendizagens para o desenvolvimento pessoal e para a modernização das empresas e da economia.
De forma a assegurar o seu funcionamento e regulação, o SNQ integra as seguintes estruturas:
- organismos públicos (Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional - ANQEP, I.P.; Direção-Geral da Educação - DGE; Direção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho - DGERT; e o Instituto do Emprego e da Formação Profissional - IEFP, I.P.);
- organismos e estruturas com competências no domínio do financiamento das políticas de educação e formação profissional;
- centros especializados em qualificação de adultos, atualmente designados Centros Qualifica. Estes centros encontram-se sedeados em escolas públicas, escolas profissionais, centros de formação, empresas, autarquias, associações empresariais, associações de desenvolvimento local e entidades formadoras certificadas de natureza diversa com uma ampla cobertura territorial. Os Centros Qualifica funcionam em rede e asseguram a informação, orientação e encaminhamento de candidatos adultos para modalidades de formação, bem como o reconhecimento, validação e certificação das competências adquiridas ao longo da vida.
- uma rede de entidades formadoras constituída por a) estabelecimentos de ensino básico e secundário; b) centros de formação profissional e de reabilitação profissional de gestão direta e de gestão protocolar do IEFP; c) entidades formadoras privadas certificadas pela Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT); d) entidades formadoras integradas noutros ministérios ou pessoas coletivas de direito público; e) estabelecimentos de ensino particular e cooperativo com paralelismo pedagógico ou reconhecimento de interesse público; f) escolas profissionais públicas e privadas; g) entidades formadoras certificadas do setor privado; h) empresas e outras organizações que fazem formação para os seus trabalhadores.
- uma rede de 18 Conselhos Setoriais para a Qualificação, que se constitui como plataforma de discussão técnico-consultiva e de reflexão, organizada numa lógica setorial e seguindo um conjunto de princípios de estruturação/delimitação que visam identificar as qualificações essenciais para a competitividade e modernização do tecido produtivo e para o desenvolvimento pessoal e social dos indivíduos. Esta rede é composta por especialistas indicados pela área governativa que tutela o setor de atividade abrangido pelo CSQ, entidades reguladoras do acesso e exercício de profissões e atividades profissionais, parceiros sociais, centros de formação profissional de gestão direta e centros de formação profissional de gestão participada do IEFP, I.P., estabelecimentos de ensino público, particular e cooperativo (incluindo as escolas profissionais, entidades formadoras e Centros Qualifica, em particular os que tenham especialização sectorial ou regional), centros tecnológicos, centros de inovação e centros de investigação e desenvolvimento, empresas e grupos empresariais de referência, clusters de competitividade, peritos independentes, nacionais e internacionais, de reconhecido mérito, entre outros, que apoiam a ANQEP nos processos de atualização e desenvolvimento do Catálogo.
Para a operacionalização e regulação do SNQ, concorre ainda um conjunto de instrumentos estratégicos:
- O Catálogo Nacional de Qualificações (CNQ), instrumento dinâmico, de gestão estratégica das qualificações de nível não superior, essenciais para a competitividade e a modernização das empresas. O CNQ visa assegurar uma maior articulação entre as competências necessárias ao desenvolvimento socioeconómico do país e a oferta formativa promovida no âmbito do SNQ. O CNQ foi organizado numa lógica de dupla certificação, integrando, para cada qualificação um conjunto de referenciais, de âmbito escolar e profissional. Este instrumento está permanentemente aberto a atualizações ou a novas qualificações sob proposta dos Conselhos Sectoriais para a Qualificação em funcionamento, ou da própria Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional (ANQEP, IP).
- O Quadro Nacional de Qualificações regulado pela Portaria n.º 782/2009, de 23 de julho, constitui um instrumento para a classificação das qualificações produzidas no sistema educativo e formativo, de acordo com um conjunto de domínios. O QNQ contempla 8 níveis de qualificação abrangendo as qualificações produzidas nos vários níveis do sistema de educação e formação, independentemente das vias de acesso (ensino básico, secundário, superior, formação profissional e processos de reconhecimento, validação e certificação das competências obtidas por via não formal e informal). Além dos 8 níveis no Quadro Europeu de Qualificações (QEQ), o QNQ também adota os seus princípios no que respeita à descrição das qualificações nacionais em termos de resultados de aprendizagem, de acordo com os descritores associados a cada nível de qualificação. Para além da legibilidade e transparência que confere a todo o sistema e da articulação da atividade dos operadores a nível nacional e europeu, é um fator da transição para um sistema de educação e formação orientado para conhecimentos, aptidões e atitudes que determinam e traduzem as competências associadas a cada nível de qualificação.
- O Sistema Nacional de Créditos do Ensino e Formação Profissionais (regulado pela Portaria n.º 47/2017, de 1 de fevereiro), que permite a atribuição de pontos de crédito às qualificações de dupla certificação do QNQ, integradas no CNQ, e outro tipo de formação certificada não integrado no Catálogo, desde que esteja registado no Sistema de Informação e Gestão da Oferta Educativa e Formativa e cumpra os critérios de garantia da qualidade em vigor. Os pontos de crédito de uma qualificação e de cada uma das unidades que a compõem são obtidos quando os formandos alcançam os resultados de aprendizagem ou demonstram as competências a que essas unidades se referem, ou seja, quando obtêm a certificação nas respetivas unidades da qualificação. Este sistema permite a acumulação e transferência de pontos de crédito, em linha com os princípios do Sistema Europeu de Créditos para o Ensino e Formação Profissionais (ECVET), favorecendo, nomeadamente, a mobilidade no espaço europeu.
- O Passaporte Qualifica, documento eletrónico pessoal, intransmissível e facultativo do qual consta o registo individual de competências adquiridas e formações realizadas ao longo da vida, que se encontrem referenciadas ao Catálogo Nacional de Qualificações. Também pode incluir ações de formação profissional não integradas no CNQ, que pressuponham a sua conclusão com aproveitamento. O Passaporte permite ao seu titular identificar domínios em que pode adquirir e/ou aprofundar competências que melhorem o seu percurso de qualificação e possibilita ainda aos empregadores uma avaliação mais imediata da adequação das competências do seu titular a um determinado posto de trabalho.
Sistema de informação e gestão da oferta educativa e formativa
Outros dispositivos estruturantes foram criados com o objetivo de garantir o acompanhamento, a monitorização, a avaliação e a regulação do sistema, designadamente o Sistema de Informação e Gestão da Oferta Educativa e Formativa (SIGO). Trata-se de uma plataforma informática acessível a operadores e coordenadores do sistema, integradora da oferta educativa e formativa profissionalmente qualificante, anteriormente dispersa por diferentes organismos do Ministério da Educação e do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, constituindo um progresso significativo nomeadamente ao nível da legibilidade da rede de oferta, da simplificação administrativa e da utilização da plataforma como instância de lançamento, acompanhamento, monitorização e gestão da oferta.
O SIGO responde atualmente às necessidades de informação das escolas, dos centros de formação, da Direção-Geral de Administração Escolar, da DGEstE, do IEFP, I.P. e da ANQEP, I.P., que, sendo instituições com missões diferentes, utilizam também o sistema de informação para necessidades associadas à sua missão específica.
Indicadores estatísticos do SNQ
Com base na evolução do impacto das medidas criadas no âmbito do Sistema Nacional de Qualificações, importa fazer uma leitura de um conjunto de indicadores estatísticos.
Catálogo Nacional de Qualificações e Conselhos Setoriais para a Qualificação
Em 2008, ano do seu arranque, o Catálogo Nacional de Qualificações (CNQ) integrava 238 qualificações, das quais 60 tinham referenciais para o Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC) profissionais.
Considerando os dados atualizados a fevereiro de 2022, o CNQ contempla 392 qualificações com 166 referenciais de RVCC em vigor. O total de qualificações compreende 110 qualificações de Nível 2, 234 qualificações de Nível 4 e 48 qualificações de Nível 5. Este crescimento envolveu a criação de 201 novas qualificações, a exclusão de 47 e 1205 atualizações.
Neste processo de renovação e de atualização dos referenciais foi essencial o papel dos Conselhos Setoriais para a Qualificação (CSQ), estruturas onde são discutidas e aprovadas as propostas de atualização do CNQ (integração de novas qualificações, reestruturação e exclusão de qualificações).
Sistema de antecipação de necessidades de qualificações (SANQ)
A Lei n.º 82-A/2014 de 31 de dezembro, que aprovou as Grandes Opções do Plano para 2015, reforçou a importância e a necessidade de o país dispor de um Sistema de Diagnóstico de Necessidades de Qualificações. O SANQ surge neste contexto, e da necessidade da Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional, I.P. (ANQEP, I.P.), enquanto organismo com atribuições no domínio da coordenação e regulação das ofertas de educação e formação profissional de dupla certificação e da gestão do Catálogo Nacional de Qualificações, em sustentar a sua atuação num conhecimento atualizado das dinâmicas da oferta e procura de qualificações (a curto e médio prazo) e da evolução das ofertas de educação e formação.
A definição e o desenvolvimento de um modelo de antecipação de necessidades de qualificações constituiram assim, um importante passo na consolidação de uma intervenção mais informada e sustentada no domínio dos processos de planeamento e concertação da rede de oferta formativa.
O modelo do SANQ, estrutura-se em torno de três módulos (módulo de diagnóstico de base, módulo de planeamento e módulo de aprofundamento regional) que se articulam de forma encadeada, e assenta num conjunto de instrumentos metodológicos - quantitativos e qualitativos - que de forma combinada permitem uma leitura prospetiva da evolução do emprego e das necessidades de qualificações e se relacionam com a própria dinâmica de oferta de educação e formação. O SANQ tem os seguintes objetivos operacionais principais:
- a produção de um diagnóstico macro de base - contendo informação sobre as dinâmicas económicas e do mercado de trabalho que influenciam a procura de qualificações (numa perspetiva de curto e médio prazo);
- a identificação de potenciais qualificações futuras, e de necessidades de ajustamento nas existentes, que contribuem para a atualização do CNQ;
- A definição de diagnósticos de necessidades de qualificações à escala regional;
- A identificação de áreas e saídas profissionais prioritárias, quer à escala nacional, quer à escala regional, que permitam sustentar o processo de planeamento da rede de ofertas de educação e formação.
Pretendeu-se a construção de um sistema de antecipação dinâmico, com atualização contínua da informação, apoiando assim a tomada de decisão de vários stakeholders do Sistema Nacional de Qualificações, nomeadamente:
(i) dos jovens ou adultos que procuram uma qualificação e que podem recorrer aos resultados do SANQ para saber da relevância das qualificações em que estão interessados, em função da região onde pretendem desenvolver a atividade profissional;
(ii) dos serviços e profissionais de orientação, informação e encaminhamento que dispõem assim de mais um instrumento para ajudar os jovens ou os adultos a optar por percursos qualificantes mais ajustados às suas expectativas;
(iii) dos operadores de educação e formação que poderiam recorrer ao SANQ para planear as ofertas futuras;
(iv) das entidades que têm a função de estabelecer critérios para a definição da rede de ofertas de qualificação (como a ANQEP, a DGEstE e o IEFP), bem como entidades que têm por atribuição a operacionalização do financiamento das várias modalidades de acesso à qualificação (por exemplo, os Programas Temáticos ou Regionais de gestão dos fundos comunitários, no âmbito da Estratégia Portugal 2030, ou a gestão dos investimentos no âmbito da Componente 6.Qualificações e Competências do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)).
No âmbito do processo de planeamento da rede de ofertas de dupla certificação de jovens (Cursos Profissionais (CP) e Cursos de Educação e Formação (CEF)), o SANQ, tem permitido identificar áreas e saídas profissionais prioritárias à escala nacional e regional. Porque, embora partindo de um diagnóstico de necessidades de qualificações para o território continental ao nível das NUT II (diagnóstico de base), o modelo SANQ prevê, desde a sua criação, a existência de um “Módulo de Aprofundamento Regional” que contribui para a definição de diagnósticos de necessidades de qualificações à escala regional (desenvolvidos e coordenados pelas Comunidades Intermunicipais - CIM ou Áreas Metropolitanas - AM), conferindo assim uma dimensão regional à definição de prioridades na organização das ofertas de educação e formação de jovens.
Com base nos resultados do SANQ, a ANQEP, I.P. define anualmente critérios de ordenamento da rede de ofertas de dupla certificação de jovens (CP e CEF) que servem de suporte ao processo de planeamento e concertação dessas redes.
Depois da sua conceção e primeira aplicação ao planeamento da rede de ofertas no ano letivo 2015/16, a ANQEP procedeu em 2017 à atualização do módulo de diagnóstico de base do SANQ em 2017, cujos resultados viriam a ser incorporados no planeamento das ofertas dos anos letivos seguintes (2018/19, 2019/20 e 2020/21). Em 2020, foi feita nova atualização do módulo de diagnóstico de base.
Em 2016, foi disponibilizado pela ANQEP, a todas as CIM e AM, o Toolkit de Aprofundamento Regional que contempla a possibilidade de aplicação, à escala sub-regional do inquérito às empresas bem como dos instrumentos necessários para a recolha de informação qualitativa.
A utilidade do modelo assenta na atualização regular da informação que sustenta tanto o diagnóstico de base como o aprofundamento regional, possibilitando assim uma adequada monitorização das tendências de recrutamento e das necessidades de qualificações e competências e o seu contributo para os exercícios de planeamento das redes de ofertas de dupla certificação e para a atualização do CNQ.
A participação das CIM e das AM no aprofundamento regional do diagnóstico de necessidades de qualificação e na concertação local da rede de ofertas é um elemento fundamental na aplicação do SANQ e na estratégia de planeamento das ofertas de dupla certificação. É este elemento que confere ao modelo do SANQ um grau de especificidade e de reatividade considerável na resposta às dinâmicas regionais do mercado de trabalho e da economia e um espaço de capacitação progressiva dos atores locais na apropriação dos seus resultados.
Desde o lançamento do SANQ que a participação das CIM e AM tem aumentado gradualmente: 16 CIM/AM (num total de 23) desenvolvem, entre 2017 e 2020, o módulo de aprofundamento regional do SANQ, sendo que no ano do lançamento do SANQ apenas quatro CIM/AM o fizeram. Em 2021 foram 20 as CIM a desenvolver o aprofundamento regional, verificando-se 22 em 2022. Por outro lado, a crescente intervenção das CIM e AM no processo de concertação local das ofertas ao longo destes anos, tem beneficiado do aumento da capacitação das CIM e AM na fase de aprofundamento regional do diagnóstico das necessidades de qualificações.